segunda-feira, 30 de maio de 2011

Ancora 10 HUMOR

Rir é o melhor remédio. Quem me conhece bem sabe que não dispenso uma boa gargalhada. É bom ter a capacidade de nos distanciarmos das situações e rirmos de nós próprios e da vida. Manter o astral lá em cima, é tarefa que pode parecer complicada, mas que bem vistas as coisas, até não é assim tanto. Desde que estou doente, fiquei um tipo importante. Que eu saiba, só a Rainha de Inglaterra é que tem alguém para a ajudar a vestir. Eu tenho. O Sócrates, tem vários motoristas. Eu também. O Presidente da Republica, tem um secretário pessoal. Eu também. O rei Zulu, é transportado numa padiola puxada pelos súbditos. A minha cadeira também é empurrada pelo meu «povo». As pessoas importantes, tem sempre alguém para lhes abrir e fechar a porta do carro. Eu também. Lady Gaga, tem tratamentos de manicure e pedicure exclusivos. Eu também. David Beckam, usa imensos cremes para hidratar a pele da cara. Eu também. O Pacheco Pereira, tem um blog. Eu também. O Príncipe William casou com uma princesa. Eu casei com uma Rainha.

O comum dos mortais, sonha em ver um jogo de futebol sem ser interrompido com perguntas do género: «ainda falta muito para acabar essa porcaria?» ou comentários destes «agora dá todos os dias futebol na televisão». A mim perguntam-me se eu não quero ver futebol. Só falta mesmo trazerem a mini e os tremoços. É um luxo.

Durante o meu percurso profissional, fui articulando algumas frases que marcam a minha passagem pelos diferentes sítios. Quando era Director do Hotel do Caramulo, e as coisas não corriam exactamente como eu queria dizia em tom de ameaça: «Cristo ama-te, mas não abuses». Quando alguém ficava muito contente por ter recebido muitos elogios de um cliente,  rematava com «outra coisa não seria de esperar», como quem diz não fazemos mais que a nossa obrigação. Actualmente a minha deixa preferida é quando chego ao escritório, dizer «deixem-me trabalhar!», como se alguém me quisesse impedir. Gosto também de avisar que já venho sentado na cadeira de rodas para poder começar a trabalhar mais rápido que os outros.

Bem vistas as coisas esta é uma doença óptima para preguiçosos. Tem que fazer tudo por nós. Limitamos-nos a comandar. Mais para a esquerda, mais para a direita. Mais depressa, mais devagar. Convenhamos que há doenças muito piores. Imaginem o que é ter Alzheimer. Eu, não saber que sou eu. Eu, não saber quem são vocês. Terrivel não é? Prefiro mil vezes não me mexer, mas manter a minha identidade e a minha memoria intactas. Ter Alzheimer é como se estivessemos livres, e nos roubassem tudo.  Ter ELA é como se estivessemos presos,  mantendo todo o nosso património. Então, ter ELA ´não é o fim do mundo. Quando o sol brilha, brilha para todos. Conseguimos ver, mesmo atrás das grades.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Ancora 9 APELA

A APELA é a Associação Portuguesa de Esclerose Lateral Amiotrofica. Gosto muito das pessoas que conheço da APELA. Parece-me um daqueles casos em que se trabalha em prol dos outros, sem receber nada em troca. Acho que esta associação merecia ser mais apoiada pelos doentes com ELA. Não vou perguntar o que é que a APELA pode fazer por nós, mas o que é que nós podemos fazer pela APELA, e porque é que esta associação é assim tão importante. Em primeiro lugar, devemos ser sócios e mobilizar os nossos amigos e conhecidos para serem tambem socios. Contra mim falo, que só à alguns dias preenchi a ficha de socio. Estamos a falar de uma quota mensal de 2,50 euros ou 30 euros anuais. Irrisório, mas pode fazer a diferença. Qualquer associação tem custos de manutenção que tem que ser suportados pelos seus associados. Estou a falar no telefone, da luz, do correio, de deslocações, etc. A APELA nunca será uma associação rica, nem é isso que se pretende, mas tem que ser uma associação capaz de se manter a si mesma. Em segundo lugar, mobilizarmo-nos para participar nas ações promovidas pela associação. Em terçeiro lugar participarmos, na vida da associação, indo às assembleias gerais, ou fazendo-nos representar. Se todos fizermos isto, a APELA será uma associação muito mais forte e com outra capacidade de ajudar os seus associados e familias.

Mas, porque é que é importante ter uma associação forte? Porque a especificidade da doença obriga a ter uma voz forte, que fale por todos nós. Isto é um assunto muito sério, e que não pode ser tomado de animo leve. Precisamos de uma voz que fale à sociedade, e que fale com o poder politico, exigindo e fazendo pressão para que a lei seja cumprida. Sabemos que a lei da acessibilidade é maravilhosa mas não é cumprida. Há obstáculos em todo o lado. Passeios sem rampa, passadeiras sem acesso, escadas sem alternativa, prédios sem elevador. Não falamos só de construções antigas. Sabemos que temos direito a ajudas técnicas, mas também sabemos que estas não chegam a toda a gente. Sabemos que temos uma lei que nos protege quando nos reformamos. É a lei nº 90/2009. Não devemos ter isto como um dado adequirido, porque na redação da lei há algo que me preocupa. A presente lei abrange as pessoas em situação de invalidez originada por paramiloidose familiar, doença de Machado-Joseph (DMJ), sida (vírus da imunodeficiência humana, HIV), esclerose múltipla, doença de foro oncológico, esclerose lateral amiotrófica (ELA), doença de Parkinson (DP) ou doença de Alzheimer (DA). Esta lei permite que os doentes se reformem contando os 3 melhores anos de descontos. É um beneficio excepcional, mas, atente-se no artigo 11º da referida lei, que passo a transcrever:


Artigo 11.º
Comissão

No prazo de 60 dias a contar da data de entrada em vigor da presente lei o governo deve proceder à criação de uma comissão especializada com a competência de:
a) Definir os critérios de natureza clínica para a determinação das doenças susceptíveis de serem abrangidas pelo regime especial de protecção na invalidez;
b) Avaliar e reavaliar com carácter trianual a lista de doenças abrangidas pelo regime especial de protecção na invalidez.

De acordo com a redação da alinea b), de 3 em 3 anos a lista de doenças abrangidas pelo regime especial de protecção na invalidez, pode mudar. Este beneficio pode ser alterado. Por isso precisamos de uma Apela forte, capaz de gerar correntes de opinião na sociedade e de influenciar o poder politico. As dificuldades da Apela resultam do facto da ELA ser uma doença com uma incidência baixa. Por comparação, existem cerca de 5.000 doentes em Portugal com Esclerose Multipla. Com a Esclerose Lateral há cerca de 500 doentes. A esperança de vida de um doente com Esclerose Multipla é cerca de 40 a 50 anos. Se a ELA, que tem uma esperança de vida média de 2 a 5 anos, tivesse a mesma sobrevida da Esclerose Multipla, constatariamos que a incidência não é assim tão baixa. Por outro lado, os doentes aproximam-se da associação quando descobrem que tem a doença, tal como as suas familias. Quando os doentes morrem, é normal as familias afastarem-se da associação. Não temos portanto um numero suficiente para fazer loby, mas temos obrigação de lutar por isso.

A meu ver a APELA precisa de uma direcção, capaz de mobilizar meios para fazer as obras necessárias na sede. Precisa de uma direcção, capaz de criar nucleos regionais, no Norte, Centro, Sul e Ilhas. Precisa de uma direcção que recrute uma rede de voluntários no terreno para apoiar as familias. Precisa de fazer formação ás familias, ás empresas, ás instituições, de como lidar com um doente com ELA. Precisa de criar eventos capazes de atrair a opinião pública, e de ter notoriedade. Quanto mais notoriedade tiver a associação, mais facil será obter apoios. Precisa de ter gente da ciência, para lhe dar credibilidade e reconhecimento.Precisa de desenvolver relações internacionais com outras associações congeneres, para verificar o que está a ser feito lá fora. Se necessário copiar os bons exemplos. Muitas destas coisas já foram feitas ou estão a ser feitas. Tem se feito um trabalho extraordinário e com muitos poucos recursos, muito`à custa do empanho e da carolice das direcções da associação. Como doente, digo obrigado APELA. Obrigado pelo apoio, pela informação, pelo carinho, pela força. Contem comigo para colaborar no que puder. Todos contra a ELA. Todos pela APELA! 

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Ancora 8 INFORMAÇÃO

Após o diagnóstico, uma das questões que me coloquei foi «e agora como é que vai ser?». A desorientação inicial obriga-nos a pensar em muitas coisas e a traçar uma serie de cenários. A tendência natural é recorrer à net e pesquisar. A informação que se encontra, é contudo, demasiado brutal. É preciso processar essa informação. Expressões como doença degenerativa, fatal, progressiva e sem cura, com uma sobrevida extremamente curta, são o prato do dia. O doente com ELA é, fruto da sua doença, um mutante. Evolui de um estado em que se preocupa com o futuro, para outro em que se preocupa em viver o presente. Essa mutação ocorre  gradualmente, à medida que a doença evolui. Quando se atinge esta maturidade estamos aptos a enfrentar qualquer coisa, por mais difícil que esta seja.


É muito importante ter informação real que nos mantenha conscientes, do forte handicap que temos, mas que ao mesmo tempo não nos tire a vontade de lutar. A nossa qualidade de vida, no dia a dia passa a ser um factor primordial.Ter uma cama articulada, um sofá reclinável, um elevador de transferencia, uma cadeira de conforto e um instrumento de comunicação aumentativa, são equipamentos que passam a fazer parte do nosso universo. Há uma serie de voltas administrativas, que são cansativas e que exigem tempo, mas fundamentais para obter todos os benefícios que a lei nos concede. A primeira coisa é ter um relatório do medico que nos segue, onde é estimada a nossa incapacidade. Com esse relatório deverá ser marcado uma consulta de saúde publica para obter o certificado de incapacidade multiusos. Este certificado permite obter junto do IMTT, o dístico de cidadão com deficiência para colocar na viatura. Este mesmo certificado serve para reclamar seguros de vida relativos ao credito à habitação, bem como ter isenção fiscal  na aquisição de viaturas e isenção do imposto de circulação. Em termos laborais, é possível pela lei actual estar de baixa 36 meses. Uma vez que a doença é fortemente incapacitante e irreversivel, é natural que muitos doentes se reformem antecipadamente. Também aqui o certificado multiusos é importante para dar inicio ao processo. Deixo aqui referencia a algumas leis e dec.leis fundamentais para nós:

Lei nº 90/2009, Lei nº 22-A/2007, Dec-Lei nº 43/76, Dec-Lei nº 352/2007

Também em termos de pesquisa, deixo a referencia de sites e comunidades onde se pode obter boa informação e  partilhar experiências:

APELA, Associação Portuguesa de Esclerose Lateral Amiotrofica. Tem uma pagina no Facebook e um espaço denominado de Comunidade ELA-Portugal, consulte em  http://noseela.ning.com/

Comunidade Ela Brasil, consulte em http://comunidadeelabrasil.ning.com/

http://www.patientslikeme.com/

http://www.alsa.org/

http://www.andrecontrelasla.be/-la-recherche-.html

http://genoma.ib.usp.br/

http://www.fchampalimaud.org/home/portuguese-summary/programa-de-neurociencia/




 

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Ancora 7 FISIOTERAPIA

Como hoje ia escrever sobre este tema, resolvi ir ao Alcoitão,visitar as minhas queridas terapeutas. Para alem da visita a minha intenção era comprar um pack de 10 sessões para voltar a fazer terapia ocupacional e fisioterapia. Frequentei o Centro de Reabilitação de Alcoitão desde Março de 2010 até Janeiro de 2011. Foi difícil, mas não impossível, conseguir que os meus tratamentos fossem suportados pela ARS de Lisboa. Depois de obter a credencial comecei então a fazer fisioterapia e terapia ocupacional. Parei em Janeiro de 2011. Aproveitei o facto de o Hotel Onyria Marinha Edition, estar prestes a abrir para me focar no trabalho e fazer um interregno na actividade física. Era pois com redobrada expectativa que hoje voltava ao Alcoitão.

Tive logo uma má noticia. Soube que a mãe da minha terapeuta ocupacional tinha falecido em Fevereiro. Quando se tem ELA, morrer alguém que nós conhecemos com a mesma doença, é quase como ver partir um famíliar. Não sei porquê, mas cria-se entre nós uma grande solidariedade. Não sei se com as outras doenças é igual, mas nós os ELAS, partilhamos experiências, trocamos mensagens e queremos saber uns dos outros. Conheci a Maria do Ceu, no Alcoitão. Recordo dela o sorriso, a força de vontade e o orgulho que tinha nos netinhos e na família. Presto-lhe aqui, a minha sentida homenagem.

Quando comecei a fazer terapia ocupacional, tive a sorte de ter como terapeuta a Ana Rita Henriques. Não é fácil encontrar profissionais na área da saúde que estejam plenamente identificados com a doença. Muitas vezes, nem os médicos (clínica geral), e sobretudo o staff que está na triagem das urgências hospitalares, sabem todos os cuidados necessários a ter com um doente destes. Foi portanto uma vantagem encontrar alguém tão profundamente conhecedor. Entrei perro dos braços e quase sempre com as mãos inchadas. Gradualmente, aumentei muito a mobilidade dos meu braços obtendo uma boa amplitude de movimentos. Melhor do que tudo foi que as dores que tinha no ombro direito sempre que fazia um movimento mínimo, desapareceram. Até hoje. Também as mãos ao serem regularmente mobilizadas deixaram de estar inchadas. Por aqui se pode atestar da importância da terapia ocupacional nesta doença. Mas, não era só esta disciplina que eu tinha neste curso superior de vida. Também tinha fisioterapia. A minha terapeuta, Alexandra Salgueiro, começou a trabalhar comigo alguns exercícios de força e alongamentos. A dificuldade de regular a intensidade nas sessões de fisioterapia, resulta do facto de se ter que acertar na mouche. Não fazer, é péssimo porque com a progressão da doença dificilmente se mantém os músculos entrando rapidamente em atrofia muscular; fazer de mais, é pior a emenda que o soneto, porque rapidamente se entra em fadiga muscular e se desgasta o músculo conduzindo à sua degradação. O equilibrio entre essas duas variáveis é a dose certa. Foi isso que eu tive. Um treino equilibrado, variado e adaptado às minhas limitações. No inicio ainda fazia treino de marcha. Posteriormente, quando a marcha se tornou impossível, trabalhámos num colchão, na bicicleta sem resistência e no stanging frame. A Alexandra tem especial predilecção pelos alongamentos. Eu tenho a sensação que tenho umas cordas dentro de mim que são mais curtas do que deviam. Quando alongo, parece que as «cordinhas» vão partir. Dói, mas faz muito bem, porque atrasa os encurtamentos e  previne as eventuais deformações.

Uma das coisas boas da fisioterapia e terapia ocupacional, é que são feitas em ambiente descontraído e de boa disposição. Isso contribui para manter um bom astral nos utentes. Confesso que nunca fui adepto de massagens nem de qualquer tipo de terapia em que tocassem no meu corpo. A generalidade das pessoas diz, que as massagens as relaxam; a mim põe-me tenso. Culturalmente, neste aspecto, sou um pouco British, ou seja, gosto de ter um perímetro de segurança há minha volta. Os Árabes, culturalmente tocam-se e abraçam-se. O mundo da fisioterapia é um pouco como o mundo dos Árabes. Temos que nos habituar a quem nos toca e a que manipulem o nosso corpo. E não é só o nosso, porque o corpo do terapeuta também invade o nosso espaço. Os fisioterapeutas e os terapeutas ocupacionais tem portanto uma relação descontraída com o corpo. Eu não estava habituado a isso. No principio ficava um pouco sem jeito, mas depois habituei-me. Afinal somos todos humanos. Esta simplicidade  e a forma genuína como se fazem as coisas foi para mim uma lição.

Agradeço muito às minhas terapeutas  terem puxado por mim e zangarem-se quando eu me baldava. Parece até que as terapeutas se importavam mais com a condição do doente do que o próprio. Neste capitulo não sou exemplar e desafio todos os ELAS a serem melhores do que eu. Aquilo que tenho de sobra em atitude para contrariar a doença, falta-me em vontade para fazer exercício. Mas prometo que vou mudar!

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Ancora 6 MEDICOS

Após meses de hesitação, resolvi ir ao médico. Escolhi um Neurologista na Clínica Cuf de Cascais. Logo após a primeira consulta o médico suspeitou de doença do neurónio motor. Fiz uma serie de exames, como um TAC, RM, analises clínicas, electromiografia. Foi então que o Dr. Bandeira me falou da ELA, e recomendou que fosse seguido numa consulta da especialidade num hospital publico. Na altura não sabia o que era a doença, mas rapidamente fiquei a saber pelas pesquisas que fiz na net. Decidi que tinha que ouvir outras opiniões de especialistas. Como a minha irmã trabalha na área de investigação da Universidade de Louvain, rapidamente consegui uma consulta com o Profº Vandenberg. Ia com bastante expectativa. O dito especialista, recebeu-me com um ar professoral, como se eu fosse maluquinho por ir de Lisboa a Bruxelas para uma consulta. O resultado da consulta foi absolutamente inconclusivo. «Pode ter ELA ou não, mas isso só vamos saber com a evolução, e o melhor é ser seguido numa consulta de especialidade em Portugal». Apesar do apoio da minha querida irmã, vim de Bruxelas com o coração nas mãos. Queria saber se sim ou sopas, mas aparentemente não havia médico capaz de responder à minha pergunta, de uma forma inequívoca. Ainda não totalmente convencido, e incentivado pelo meu sobrinho João Barbosa, decidi ir a Oxford consultar-me com o Dr. Kevin Talbot. Desta vez desafiei a minha mulher para vir comigo. A consulta era numa sexta feira, e depois podíamos aproveitar o resto do fim de semana em Londres. Fui para Londres cheio de esperança. No meu intimo imaginava o Dr. Kevin Talbot a rir-se à gargalhada do diagnóstico que me tinham dado, e a dizer-me enquanto me dava palmadas nas costas: «Isso é só cansaço homem! Em Portugal não percebem nada disso. Tire umas férias que isso passa».  Mas não foi isto que o Dr. Talbot me disse. Quando regressávamos de comboio de Oxford para Londres, parecia que o mundo tinha desabado em cima de mim. Que profunda desilusão. Afinal, não só, não me ia libertar daquele pesadelo, como ainda estava no inicio. Esse dia foi muito complicado. Devo ter dormido muito pouco nessa noite. No dia seguinte quando acordei, pensei que não havia nada que eu pudesse fazer para mudar a situação, pelo que resolvi aproveitar o sábado e o domingo com a minha mulher. O Hotel onde ficámos era próximo de Waterloo station, do London Eye, e do Big Ben. Passeamos bastante por Londres e passamos uma tarde muito agradável em  Portobelo Road. Estava um tempo fantástico e eu quase que me esqueci da doença.

De regresso a Portugal estava finalmente decidido a inscrever-me numa consulta de doenças neuromusculares. Um pouco aleatoriamente escolhi o Hospital de São José. A minha médica passou então a ser a Drª Luisa Medeiros. Ao contrário das indicações dos médicos anteriores, a Drª Luisa Medeiros sempre adiou o diagnóstico de ELA. Fui sendo seguido ao longo de um ano e fazendo uma série de exames para despistar outras eventuais causas. Fiz vários electromiogramas, potenciais evocados, fiz uma punção lombar e um PET. Este arrastar de diagnóstico, manteve em mim uma secreta esperança de ter outra coisa qualquer, que não esta. Como o diagnóstico tardava, fui fazendo mais algumas pesquisas, até que encontrei o nome do Prof. Mamede de Carvalho como um dos grandes especialistas a nível mundial. Marquei uma consulta no Hospital de Santa Maria. O Prof. Mamede de Carvalho disse-me que não tinha qualquer duvida e que eu tinha mesmo ELA. De certa forma foi um alivio. Apeteceu-me dizer «já sei o que tenho agora deixem-me em paz, estou farto de medicos».

O diagnóstico de ELA é muito difícil de fazer. Quando alguém tem falta de força numa perna é muito natural que seja encaminhado para um ortopedista. O acompanhamento de um doente com ELA, implica mobilizar uma serie de especialistas, tais como, neurologista, fisiatra, fisioterapeuta, terapeuta da fala, pneumulogista, psicólogo e gastroentrologista. Como a doença afecta todos os músculos não voluntários, compromete mais cedo ou mais tarde a locomoção, a fala, a respiração, a deglutição e a alimentação. Regra geral os Hospitais em Portugal não estão preparados para ter uma consulta que abarque um tão grande numero de especialidades. Felizmente a consulta do departamento de neurociencias do Hospital de Santa Maria é muito completa, e disponibliza, não só o Prof. Mamede de Carvalho como neurologista e chefe de equipa, mas também a Drª Susana Pinto e a Profª Anabela Pinto como fisiatras, podendo ser feita fisioterapia no Hospital em ambulatório (em Medicina Física e Reabilitação), bem como a terapeuta Luz na área da terapia da fala. É a consulta mais bem organizada e isso tem-lhe granjeado prestigio internacional.

Quando se enfrenta um diagnóstico destes é frequente recorrer-se a terapias alternativas. Eu sou muito céptico em relação a isto, mas não sou dono da verdade. Fala-se muito da medicina molecular, medicina quântica, terapias sacro cranianas, acumpuntura e outros. Se trouxerem bem estar emocional ao doente, porque não? Não acredito é em mais nenhum efeito para alem deste. Até prova em contrario.

Este meu périplo pelos diferentes médicos e hospitais leva-me a concluir o seguinte: para as doenças neuromusculares, temos em Portugal um dos especialistas de referencia a nível mundial. A consulta está muito bem organizada (excepção feita à Margarida, a adiministrativa que marca as consultas e que distribui azedume e má disposição por toda a gente. Até ao dia em que me salte a tampa!) e apoia o doente com ajudas técnicas. Vamos ver se com a troika e as suas medidas de austeridade, esses apoios não são cortados. A nível de ventilação não invasiva (como é o meu caso), o hospital tem um apoio constante de técnicos da Linde, que acompanham as consultas de fisiatria, e que se deslocam a casa dos doentes com muita regularidade. A única desvantagem é talvez no campo da investigação. Em Portugal há muito pouca investigação. Convém por isso estarmos atentos ao que se passa lá fora, nomeadamente, Brasil, EUA, Israel e Alemanha. Também a nível do teste de novos medicamentos, por aquilo que tenho verificado, o Hospital de Santa Maria, participa em poucos. Tiro esta conclusão ao pesquisar na net e ver que em Boston, e na Europa se estão a testar medicamentos. Não sei se o criterio da não participação nestes testes é cientifico ou se resulta da falta de recursos financeiros. Tenho muitas expectativas em relação à Fundação Champalimaud. Espero investigação de topo na área das neurociencias em Portugal.

Não posso deixar de referir a forma como a Drª Luisa Medeiros, sempre me tratou. É o tipo de medico que faz tudo pelos seus doentes. É uma amiga. Quem me dera que ela estivesse certa.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Ancora 5 AMIGOS

Sempre entendi a amizade como um acto de dar e receber, sem olhar a quem dá ou recebe mais. Para qualquer pessoa ter amigos é fundamental, quanto mais para um doente com ELA. Sentir o seu apoio, pode fazer a diferença em muitos momentos da nossa vida. Nunca fui um especialista a cultivar amizades. Estas, sempre surgiram de forma natural e desinteressada. São talvez as amizades mais bem alicerçadas porque não dependem das circunstancias, mas da livre e espontânea vontade dos indivíduos. Talvez por isso me possa orgulhar de ter grandes Amigos. Não precisamos de estar juntos todos os dias, todas as semanas ou sequer todos os meses. Estas amizades são sentimentos suficientemente maduros para resistir ás provações do tempo. Quando estamos, estamos. Como se estivessemos ontem. Como se estivessemos sempre. Se calhar é isto mesmo que acontece. Ter um amigo é estar sempre com ele, mesmo que fisicamente estejamos longe, porque em parte ele habita no nosso coração. Posso mesmo dizer que os meus amigos, fazem parte do meu  património. Com cada um deles vivi momentos especiais, a maior parte das vezes, cheios de felicidade.

Já me questionei se existem diferentes níveis de amizade, ou diferentes tipos de amigos. Há aquele amigo que é como um irmão; há aquele que é o indicado para nos animar; há aquele a quem contamos tudo ou quase tudo; não importa muito cataloga-los, desde que caibam todos dentro do baú da amizade. São amigos, e independentemente da categoria,  isso é o mais importante. E se de repente um patrão se transformar num amigo? Um dia fui chamado e disse-me: «Henrique, tudo o que precisares eu estou cá». Apeteceu-me saltar por cima da secretária e dar-lhe um abraço. Não perdi a compostura. Com uma mensagem destas, um homem  por forte que seja, tem que fazer um esforço para se aguentar nas canetas. Ouvi calmamente, e sai tranquilo, mas cheio de vontade de dizer: «obrigado Zé Carlos, és o maior». Mais recentemente na inauguração do Hotel Onyria Marinha Edition, o boss, descia a escada acompanhado do Presidente da Republica, com uma legião de pessoas atrás. Eu estava sentadinho na minha cadeira de rodas, bem posicionado para assistir aos discursos e poder ver o momento solene do descerrar da bandeira. Qual não é o meu espanto quando se dirige a mim e me apresenta ao Presidente da Republica. «Este é o Henrique e é um homem extraordinario que ajudou muito». Troquei breves palavras com o Presidente e com a Drª Maria Cavaco Silva. Falei sobre a doença, com o qual estão familiarizados, pois o irmão do Presidente da Republica foi vitima da ELA. Senti os holofotes todos virados para mim. Foi um gesto muito bonito, e de grande reconhecimento. Estava comigo o meu amigo Albano, que se apressou a comentar o sucedido. No final da festa quando se despediu de mim, disse-me que estava muito feliz por me ver «tão bem enquadrado e apoiado por esta gente». Muitas vezes repeti para mim, mesmo esta maxima: trabalho é trabalho, conhaque é conhaque. Tentei fazer isto ao longo da vida. Achava que para desempenhar melhor o meu trabalho não devia desenvolver amizades dentro da empresa. Fui apanhado na curva, pois dentro da minha empresa muitas pessoas que trabalhavam comigo se revelaram autenticos amigos. Se tivesse que relatar episódios que  me marcaram, teria muito que escrever. O Raul Solnado disse uma vez na televisão que só há duas formas de agradecer: uma é obrigado, a outra é muito obrigado. E é isso que eu digo a todos os meus magníficos, extraordinarios e fantásticos amigos. Muito Obrigado!

Ao longo do meu processo, tenho tido muito apoio dos meus amigos. Isso deixa-me obviamente feliz, por sentir que são meus, mas também por ter a certeza que tenho amigos até à eternidade.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Viver com ELA: Ancora 4 TRABALHO

Viver com ELA: Ancora 4 TRABALHO: "Ainda me lembro, quando tomei a decisão de me mudar para o Hotel Quinta da Marinha Resort. Tinha tido uma conversa com o Engº Pinto Coelho, ..."

Ancora 4 TRABALHO

Ainda me lembro, quando tomei a decisão de me mudar para o Hotel Quinta da Marinha Resort. Tinha tido uma conversa com o Engº Pinto Coelho, e na altura coloquei uma questão que me parecia fundamental: «se tem os seus filhos a trabalhar consigo, porque não dirigem eles o Resort?» A resposta não me deixou duvidas: «apesar de sermos um grupo que assenta numa base familiar, queremos ter bons profissionais a trabalhar connosco». Além disso, acrescentava, «os meus filhos são pessoas extraordinariamente normais». Fiquei a pensar nesta definição. Extraordinariamente normais! Espero que um dia a possa aplicar aos meus filhos. De facto hoje em dia é uma anormalidade lidar com gente normal, que tenha valores, seja educada, culta, com vontade de trabalhar e sobretudo despretenciosa. Foi assim que viemos todos do Funchal. Em boa hora. Vivi entre Novembro de 2007 e Novembro de 2008 um ano muito feliz na direcção do Hotel Quinta da Marinha Resort. Excelente equipa, muito motivada para fazer coisas e aberta a novidades.

Em Novembro de 2008, precisamente no dia a seguir à nossa festa anual, tive a confirmação do meu diagnóstico. Relutante, não o aceitei logo. Pedi várias opiniões e fui consultar especialistas a Oxford e  Bruxelas. A partir dai, a minha cabeça não estava centrada nos problemas do trabalho, mas sim na incerteza do que viria a seguir. Foram tempos difíceis. Por um lado tinha que dar uma imagem forte, por outro ainda estava a perceber se o que me tinham dito era um pesadelo ou a realidade. Em Julho de 2009 o Engº Pinto Coelho, chamou-me ao gabinete para falar comigo. Não vou revelar o teor da nossa conversa, mas dizer apenas que a partir dai, fiquei muito mais tranquilo em relação ao meu futuro e ao da minha família. Em Setembro desse ano mudei para a equipa de novos projectos. Deixei a direcção de operações do Hotel Quinta da Marinha Resort e passei a dedicar-me ao futuro Onyria Marinha Edition. Fiquei muito feliz por ter esta oportunidade. No fundo a empresa foi-se adaptando às minhas necessidades crescentes. Isto é notável. Quando precisei de apoio físico, foi contratada uma pessoa para me assistir. Quando precisei de apoio ás minhas actividades de vida diária, o SMP disponibilizou um técnico para ir a minha casa 2 horas por dia para me preparar. Manter-me activo, desenvolver uma actividade e continuar a sentir-me útil tem sido muito importante. Não tenho palavras para classificar este apoio. Costuma-se dizer que Deus escreve direito por linhas tortas. Se eu não estivesse nesta empresa, muito provavelmente estaria agora em casa sem nenhuma actividade. Sinto-me profundamente grato por tudo o que tem feito por mim.

Ter uma ocupação é fundamental para um doente com ELA. Eu sei que nem todos terão a sorte que eu tive e alguns já abdicaram das suas actividades por lhes faltar o apoio que eu tenho tido. Mesmo assim não desistam. Tenho a certeza que há algo em que são diferentes dos outros e onde podem acrescentar conhecimento, ou experiência. E hoje temos a Internet, uma janela aberta para o mundo.

Tenho também a sorte de ter colegas de  trabalho fantásticos. Sinto-me bastante acarinhado por todos. O ambiente é excelente. Durante este período em que estou a trabalhar na área de projectos, multiplicam-se as situações em que vivi o verdadeiro significado da palavra solidariedade. Lembro-me uma vez que eu tinha uma reunião com um potencial fornecedor do Hotel Onyria Marinha Edition. Já estava um pouco atrasado para a reunião, e com a pressa de chegar, optamos por ir  para a sala de reuniões, atravessando um caminho de relva. Na altura  eu ainda andava. Acabei por tropeçar e ficar estendido na relva. O Luis, o meu care giver, tentou levantar-me sem sucesso. Por azar  na altura não havia nenhum homem no escritório. Foi preciso ligar para a recepção do Hotel, para mandar vir um bagageiro para ajudar. Enquanto esperavamos pelo bagageiro, duas colegas minhas, a Vanda (Magda) e a  Arq. Susana, sentaram-se ao meu lado. Os fornecedores que já tinham chegado, iam assistindo a cena atravez do vidro da sala de reuniões, sem perceber muito bem o que se estava a passar. Só me lembro que nos rimos até ficar sem forças. As ideias idiotas surgiam em catadupa. «Embora fingir que estamos a apanhar banhos de sol», dizia a Susana;«embora fingir que somos hippies e fazer a reunião aqui fora», e assim sucessivamente até chegar a tão desejada ajuda. Obviamente que no final esclarecemos tudo com o fornecedor, que acabou por se rir imenso de toda a situação.

São estes bocadinhos preciosos, que fazem com que o trabalho seja uma das ancoras fundamentais para um doente com ELA.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Ancora 3 ATITUDE

"Vivemos a vida como se ela fosse eterna, como se a morte fosse algo que só acontece aos outros e apenas nos está reservado ao fim de muito tempo, tanto tempo que nem merece a pena pensarmos nisso. Para nós, a morte não passa de uma abstracção. (...) Mas o problema é que a morte não é uma abstracção. Em boa verdade, ela está já aqui ao virar da esquina. Um dia, estamos nós muito bem a deambular pela rua da vida como sonâmbulos, vem um médico e diz-nos: você pode morrer. E é nesse instante, quando de repente o pesadelo se torna insuportável, que finalmente despertamos"

In A Formula de Deus, José Rodrigues dos Santos

Em Abril de 2008 o Hotel Quinta da Marinha criou uma equipa de futsal para participar num torneio com outros Hotéis. Como promotor da ideia, também fiz parte da equipa. Achava que ter uma equipa de Futsal podia ajudar a reforçar os laços entre as pessoas, e aproveitar esse factor de motivação extra para o trabalho que queria fazer no Hotel. Lembro-me que quando começaram os jogos eu sentia bastantes dificuldades em acompanhar. Passavam-me a bola e eu não conseguia chegar lá. Na altura atribuía isto ao excesso de peso e ao cansaço. Quando uns meses depois os meus músculos começaram a tremer involuntariamente, aliado ao facto de sentir falta de força na perna direita, comecei a ficar preocupado. A minha mulher insistia para eu ir ao médico. Eu respondia que isto devia ser stress. Com o aumento dos tremores involuntários, comecei a pensar que podia ter Creutfeld Jacobs, mais conhecida como a «doença das vacas loucas». Após o curso de Gestão Hoteleira, tinha estado um ano em Inglaterra, precisamente em 1991, ano da primeira Guerra do Golfo e também período critico da referida doença. Tinham passado 17 anos e o período de incubação era de 15 a 20 anos. Ao ver-me tremer, lembrava-me também das imagens de João Paulo II. Parkinson era uma ideia que me passava pela cabeça.

Quando finalmente me decidi a ir ao médico,  escolhi um neurologista. Logo na primeira consulta o Dr.Bandeira levantou a hipótese de doença do neurónio motor, ao pedir uma electromiografia. O resultado não deixava muitas duvidas e fui aconselhado a ser seguido num Hospital publico, numa consulta de neuromusculares. Foi a primeira vez que ouvi falar de Esclerose Lateral Amiótrofica.

O que se seguiu foi o pânico total. Afinal estas coisas não acontecem só aos outros. Eu quase nunca tinha entrado num Hospital, e arranjava justificações para as doenças dos outros. Tive uma sensação do chão a fugir-me debaixo do pés. Pela primeira vez tomava consciência de que a vida não é como nós queremos. Nós tomamos as coisas como garantidas. Como diz o extracto que reproduzi em cima, vivemos a vida como se ela fosse eterna, e como se a morte só nos estivesse destinada ao fim de muito tempo. Eu que me preocupava mais com o futuro do que viver o presente, aprendi a minha primeira lição: viver o presente, um dia de cada vez.

O meu colega Patrick, ex director de operações do grupo Onyria no Algarve, encontrou-me em Janeiro de 2010 na BTL. Como já não me via há muito tempo, foi para ele um choque  ver-me em cadeira de rodas. Percebi ao falar-lhe a dificuldade que tinha em conter as lágrimas. Durante a nossa conversa, tive mesmo que o animar. Nesse dia vim para casa a pensar no Patrick, e no choque que a minha condição lhe provocara. Passado pouco tempo recebi com profundo pesar a noticia da morte do Patrick. Ataque cardíaco fulminante. Um homem saudável e novo. Aprendi a minha segunda lição: ninguém tem bola de cristal para antecipar cenários.

Estas experiências dolorosas, fizeram-me mudar a minha atitude face à doença e à vida que tenho para viver. Há uma vida para ser vivida, independentemente das condições dessa vida. Pode ser digna e muito feliz. Um doente com ELA tem na realidade, duas hipóteses: desistir, e tornar a doença ainda mais difícil bem como a vida de todos os que o rodeiam, ou lutar, tentar ser feliz vivendo um dia de cada vez. Escolho claramente a segunda hipótese. Nem sempre que o céu está carregado de nuvens é sinal de tempestade. Não vale a pena  sofrer por antecipação.

Respira a chuva que cai, o sol que aquece, o vento que empurra. Respira o cheiro da terra húmida, a imponência da árvore erguida, a magia das asas de um pássaro. Respira – para saberes que vale a pena continuar.

Pedro Chagas de Freitas



We live life as if it were eternal, as if death were something that only happens to others and is only allowed in after a long time, not so long that we think is worth it. For us, death is an abstraction. (...) But the problem is that death is not an abstraction. In truth, it is already here around the corner. One day, we are very well up the street life like sleepwalkers, a doctor comes and tells us: you can die. And it's that moment when suddenly the nightmare becomes unbearable, they finally wake up "

 
In A Formula de Deus, José Rodrigues dos Santos

 
In April 2008, Hotel Quinta da Marinha created a soccer team to participate in a tournament with other hotels. As a promoter of the idea, I also made the team. I thought that having a team of Futsal could help strengthen ties between people, and enjoy that extra motivation factor for the work I wanted to do at the hotel. I remember when the games started I felt a lot of difficulty keeping up. They passed me the ball and I could not get there. At the time attributed this to overweight and fatigue. When a few months later my muscles began to shake involuntarily, and the fact of missing strength in the right leg started to get worried. My wife insisted I go to the doctor. I replied that this was only stress. With the increase of involuntary tremor, I started thinking that could have Creutfeld Jacobs, better known as 'mad cow disease'. After the course of Hotel Management, had been a year in England, specifically in 1991, the year of the first Gulf War and also critical period of the disease. They had spent 17 years and the incubation period was 15 to 20 years. On seeing me tremble, it reminded me also of images of  Pope John Paul II. Parkinson was an idea that occurred to my mind.
When I finally decided to go to the doctor, I chose a neurologist. Right at the first consultation Dr.Bandeira hypothesized motor neuron disease, as he asked a electromyography. The result did not leave many doubts and I was advised to be followed in a public hospital, a neuromuscular consultation. It was the first time I heard of amyotrophic lateral sclerosis.

What followed was total panic. After all, these things do not happen only to others. I almost never had entered a hospital. I had a feeling the ground slipping away under my feet. For the first time became aware that life is not like we want. We take things for granted. As the extract reproduced above, we live life as if it were eternal, and as if death were aimed only at the end of a long time. I who cared more about the future than the present living, I learned my first lesson: to live this one day at a time.
My colleague Patrick, former director of group operations Onyria Algarve, met me in January 2010 in BTL. It was a shock to see me in a wheelchair. I realized while talking with him the difficulty he had in hidden tears. During our conversation, I had to cheer him. That day I came home thinking about Patrick, and in shock that my condition caused him. Shortly thereafter I received the news with deep regret the death of Patrick. Massive heart attack. A man healthy and young. I learned my second lesson: nobody can see the future to anticipate scenarios.
These painful experiences have made me change my attitude facing disease and life that I have to live. There is a life worth living for, whatever the conditions of that life. Can be dignified and very happy. One patient with ALS have actually two choices: give up, and make the disease even more difficult as well as the lives of all who surround him, or fight, try to be happy living one day at a time. Clearly  I choose the latter. Not where the sky is overcast it is a sign of storm. Not worth suffering by anticipation.
Breathe the falling rain, the sun heats up, the wind pushing. Breathe the smell of wet earth, the grandeur of the tree up, the magic wings of a bird. Breathe - to know what it's worth continuing.
Pedro de Freitas Chagas

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Ancora 2 DEUS

Tive uma educação dentro dos princípios do Catolicismo. Durante a minha adolescencia, comecei a questionar a religião e inscrevi-me no rol dos Católicos não praticantes, ou pouco praticantes. Tinha vontade de acreditar mais, mas as questões em volta da fé nunca encontravam em mim uma resposta satisfatória. Pensava que a vida, tinha que ter um sentido mais vasto, do que aquele que conhecemos. Tive várias conversas com amigos sobre a existencia de Deus, sempre inconclusivas, obviamente. A minha tendencia natural seria aproximar-me da religião. Apesar de pouco praticante, e de muito questionar, dei sempre aos meu filhos uma educação de acordo com os principios e valores que recebi.

Há na Igreja um Homem que muito admirei, e que é para mim uma referencia: João Paulo II. Este Homem, foi um exemplo de luta contra uma doença grave. Ensinou-me o seu exemplo, a nunca desistir. Gravemente doente, levou a sua missão até ao fim, não se preocupando com convenções sociais, e não se escondendo apesar de muito deblitado. A sua atitude dignificou todos os que sofrem.

Quando fiquei doente, as primeiras perguntas que formulei foram: «Porquê eu?» e, «O que é que eu fiz para merecer isto?». Pensei nisto muitas vezes e com algum sentimento de revolta. Decidi falar com o Padre da minha paróquia. A conversa foi muito interessante. Uma das perguntas que o Padre Nuno me fez, foi se esta vontade de me aproximar de Deus era o resultado da minha doença, ou se era uma vontade genuína. Com franqueza lhe disse que me aproximava pelos dois motivos. Tinha a certeza que aquilo que ia encontrar pela frente, precisava de ajuda sobrehumana. Não me enganei. Naqueles momentos em que estou sozinho com a minha almofada, é com Ele que falo. Falar com Ele ajuda-me a compreender, a aceitar e a superar. Nem que seja para dizer, «seja o Deus quiser...».

Ter uma entidade metafísica e omnipresente com quem desabafar, é uma ancora valiosa para quem tem um problema destes. Seja Ele quem for.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Ancora 1, a FAMÍLIA

O doente com ELA é um doente difícil. A doença causa sofrimento psicológico e físico, pelo que gera grande instabilidade emocional. A doença afecta, não só o doente, mas todas as pessoas que o rodeiam. Talvez por isso se diga que a ELA é uma doença da família. No meu caso, quando soube que tinha ELA, «morri» e só reagi meses depois. Passou-me tudo pela cabeça. Encontrei força, carinho e cumplicidade na minha mulher. Chorámos juntos. Foi um abalo de magnitude elevada, daqueles que abanam os alicerces. Um dia a minha mulher disse-me, que o casamento era na saúde e na doença, e que ela estava cá para me apoiar incondicionalmente. Nunca me esquecerei destas palavras. Este apoio marca o meu momento de viragem em relação à forma como encarava a doença e a vida.

Deve haver uma forma mais simpática de dizer a um doente que tem ELA. Eu sou daquelas pessoas, que querem sempre saber a verdade e que gosta de ter o máximo de informação. No entanto dizerem-me que tinha uma doença fatal, sem cura, progressiva e com uma esperança de vida curta, deita abaixo qualquer um. É claro que hoje estou-me nas tintas para a minha esperança de vida. Considero isso um dado estatístico. Quero apenas ser feliz um dia de cada vez. Ninguém está preparado para uma noticia destas. Acho sinceramente que os médicos, sem esconderem a realidade ao doente, devem reflectir na forma como transmitem esta informação. O peso fatalista, de como se colocam as coisas para o doente com ELA, é muito injusto, e não tem que ser assim. Há vida depois da ELA, e essa vida pode ser digna e feliz.

Passado o primeiro impacto tínhamos mais um «dossier» importante para gerir. Como é que se conta aos filhos com 7, 10 e 14 anos que o pai tem uma doença incurável e progressiva? A resposta a esta pergunta, ainda hoje não a sei e já passaram 3 anos. Discuti muito o assunto com a minha mulher. Optámos por ir gerindo a situação. Por um lado não queriamos que os miúdos sofressem por antecipação, e por outro, não queríamos esconder a verdade. Obviamente com a evolução da doença eles foram tomando consciencia de que o pai não estava bem. Chegou o momento em que foi preciso dizer claramente que o pai tinha uma doença grave, mas que estava cá para lutar. Este momento de partilha, tenho a certeza que os tornou mais fortes. Não lhes disse logo o nome da doença. A informação que existe na internet é demasiado brutal. Preferi filtrar a informação e ir transmitindo aos poucos.

Hoje, já passaram 3 anos desde o primeiro sintoma. Já passaram 2 anos e meio desde o diagnóstico. A evolução da doença tornou-me um doente difícil. A falta de mobilidade é terrível. Estamos dependentes de terceiros para tudo. Isto causa-me alterações profundas e súbitas no meu estado emocional. Quem sofre são os que estão mais próximos. Aqueles que me inspiram e onde eu vou buscar a minha força, são aqueles que pacientemente sofrem com a minha irrasciblidade. Quero conter-me e ás vezes não consigo. A família segura. Quero ser fácil, e sei que sou dificil. Grito com quem não quero gritar. É injusto... A família é a minha principal ancora e onde eu vou buscar a minha força. Pela minha mulher e pelos meus filhos não desisto de nada. No fundo, acho que dentro do azar de ter ELA, tenho muita sorte  por ter uma mulher fantástica e uns filhos maravilhosos.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Ancoras fundamentais para um doente com ELA

Saber que se tem esta doença é um impacto muito grande. Para nos mantermos à superficie, deixo aqui algumas ancoras para continuarem a navegar  em segurança. Nos proximos dias vou relatar a minha experiencia pessoal em relação a cada um destes itens:

1. FAMÍLIA, é fundamental o seu apoio.
2. DEUS, seja Ele quem for é caso para dizer «seja o que DEUS quiser».
3. ATITUDE, a doença é grave e não convém torná-la pior.
4. TRABALHO, para nos mantermos ocupados.
5. AMIGOS, daqueles que estão lá quando é preciso.
6. MÉDICOS, é importante ser seguido numa boa consulta de Neuromusculares.
7. FISIOTERAPIA, ajuda a passar o tempo e é bom mobilizar os membros.
8. INFORMAÇÃO, deve ser q.b para nos ajudar a tomar as melhores decisões.
9. APELA, apoia sempre nem que seja com uma palavra amiga.
10. HUMOR, fundamental manter um alto astral.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Viver com ELA

Quem perde os seus bens perde muito;
Quem perde um amigo, perde mais;
Quem perde a coragem, perde tudo...